Artista fala sobre suas experiências como mulher trans ao #ModaInfo em ping-pong
Aos 27 anos, a artista Mel Gonçalves coleciona feitos dignos de nota em sua trajetória testemunhada por holofotes. Pioneira como mulher trans ao liderar um trio de música pop voltado ao público LGBT, a Banda Uó, fundada em 2009, Mel abriu caminho para outros ícones da cena como Pabllo Vittar, Liniker e Glória Groove, hoje sucessos também no mainstream, quando decidiu investir profissionalmente na sua vocação de infância.
“Sempre cantei, desde criança. Cantava muito com um tio que tocava violão e na igreja evangélica que frequentava”, conta ela, conhecida pela irreverência das suas mensagens na música, cujo eco começou a abranger outros territórios quando, em 2015, ela se tornou a primeira transexual brasileira a estrelar uma campanha publicitária do outubro rosa, visibilidade urgente no país que mais mata transsexuais e travestis no mundo.
Um ano depois, Mel foi confirmada como apresentadora fixa do Estação Plural, primeiro programa LGBT da tv aberta, ao lado da cantora Éllen Oléria e do jornalista Fernando Oliveira, com quem entrevistou personalidades como Djamila Ribeiro, Drauzio Varella e Laerte Coutinho.
Apesar de tanto êxito, Mel não se furta de incidentes infelizes de transfobia, como o noticiado por ela num processo de revista no Aeroporto do Galeão, no Rio, há um ano, quando da turnê de despedida da sua banda. Por conta de seu nome social divergir do nome declarado em seus documentos na época, a artista ficou retida por horas na área de embarque, sendo coagida a se despir para “comprovar sua identidade”.
O detalhe é que, nessa ocasião, a lei que viabilizou a desburocratização da alteração do nome social já estava valendo, o que mostra que velhos paradigmas podem ser mais difíceis de repensar do que o sistema de leis, como foi denunciado pela artista em suas redes sociais.
O final da banda coincidiu com um período de reflexão interior da Mel sobre si mesma, sua arte e a luta contra a depressão, experiência relatada pela artista em forma de poesia no videoarte Medo, coestrelado pela Liniker, que pode ser considerado uma continuação do Cabelo.
Tamanha potência criativa nos motivou a entrar em contato com ela para bater um papo sobre suas experiências em celebração ao Dia Internacional da Mulher, data que marca nosso compromisso com a conscientização de um propósito inegociável na sociedade, o feminismo.
1. Como começou sua relação com a música?
Sempre cantei, desde criança. Cantava muito com um tio que tocava violão e na igreja evangélica que frequentava. Até pouco tempo antes de sair da igreja, eu cantava. Mesmo estando no meu processo de transição carregado de silêncio.
2. O que você está ouvindo na sua playlist atualmente?
Tenho escutado muito Xênia, Luedji Luna, Gil, Sza, Jorja Smith, Sade, Beyoncé, Tuyo e Luiza Lian.
3. Você tirou o “Candy” do seu nome na mesma época que anunciou o fim da banda Uó. Como foi essa mudança de ciclo pra você?
Na verdade, eu o tirei bem depois do anúncio. Eu amo o “Candy”! É um apelido e não ligo pra quem quiser chamar, mas, meu nome Mel, foi mais difícil de ser conquistado, daí senti necessidade de dar destaque para ele. Além, é claro, do momento solo. Agora sou Mel por Mel! rs…
4. Seu último trabalho com a Liniker aponta um caminho mais introspectivo de expressão artística em relação ao traçado por você na banda Uó. Quais os próximos passos da sua carreira?
Eu quero lançar minhas músicas. Quero lançar meus clipes e quero investimento e apoio pra fazer algo bonito. Eu, sinceramente, tenho aprendido muito. Esse tempo, no qual parece que não estou trabalhando, tem me servido pra me experimentar. Mas, meus próximos passos são esses mesmos, voltar aos palcos!
5. 10-year-challenge: o que você diria pra Mel de 10 anos atrás se pudesse aconselhar a si mesma?
Diria que ela é maravilhosa, talentosa, forte, inteligente. Que ela é a farinha do bolo e a cereja também e que ela precisa acreditar mais em si
6. Talentosa, bela e inteligente, você mantém um perfil ativista nas redes sociais. Nesse sentido, o que é beleza pra você?
Beleza é o que faz a gente sorrir, sem fazer ninguém chorar. Beleza é um estado de espírito. É quando a gente se olha, se ama e sente paz.
7. Quais mulheres te inspiram atualmente? Erica Malunguinho, Djamila Ribeiro, Liniker, Mc Tha…
Me inspiro em todas as mulheres fortes que conheço de alguma forma. Tenho sorte por estar sempre rodeada de luzes.
8. Na sua opinião, quais as dores e delícias de ser mulher no Brasil nos dias de hoje?
Ser mulher é lindo e ponto. Ser mulher é rio! Ser mulher só é doloroso pela violência. Em especial o assassinato das mulheres trans e travestis, que é por quem posso falar. A dor é causada pela dominância dos nossos corpos e mentes e por um mundo feito para cercear nossos direitos.
9. Deixe sua mensagem para o nosso público.
Se eu pudesse pedir algo seria: bebam muita água, me sigam nas redes sociais, assistam aos meus stories, sejam contra qualquer opressão! A liberdade é linda! 💥❤️
Imagens: Divulgação