por Nathalia Anjos

Tendências de comportamentos têm muito mais a ver com continuidade do que com movimentos passageiros, mas no imaginário coletivo acredita-se que tendências são como modismos: efemérides que vêm e vão rapidamente.

Para começar esse texto, é preciso fazer esse alinhamento de entendimentos sobre o conceito de tendências: movimentos comportamentais que se manifestam globalmente ou localmente e que geram mudanças nos hábitos e comportamentos sociais e/ou culturais

O desdobrar desse conceito é o comportamento de consumo, uma vez que nossos hábitos e comportamentos sociais sofrem alterações, nossos hábitos e comportamentos de consumo também são drasticamente alterados. Isso porque nosso viver social está intrinsicamente ligado ao consumo de produtos, informações, imagens, e estamos o tempo todo consumindo, de um jeito ou de outro. O movimento antropofágico já problematizava isso há anos e anos…

Uma vez definido o que são tendências de comportamento fica muito simples conectar o outro tema desse texto que é a Neurociência.

Tendências e Neurociências têm muito mais em comum do que a terminação das palavras. O dicionário Michaelis traz como uma das definições das palavras o seguinte:

Tendência: “Força ou ação que determina o movimento de um corpo“.

Neurociências: Ramo da ciência ou conjunto de conhecimentos sobre a estrutura e o funcionamento do sistema nervoso.

Neurociência, no imaginário coletivo, está ligada ao cérebro, e isso está correto, porém essa área estuda não apenas o encéfalo (que é o que conhecemos por cérebro), mas também o sistema nervoso, que permeia todo o corpo humano e leva os estímulos físicos para o encéfalo, onde eles são decodificados. 

Por que, então, os movimentos de tendências comportamentais viram hábitos? Estudar coolhunting ou futurismo não é sobre o que existe de mais vanguardista? Que foge do usual?

“Somos emocionalmente viciados por certezas.”, diz Amy Webb.

Amy Webb é uma conceituada Pesquisadora de Futuros que tem a principal fala no maior evento de inovação do mundo, o SXSW (South by Southwest), que acontece anualmente em Austin, nos Estados Unidos. Em sua palestra na edição de 2020, a primeira vez do evento completamente on-line,  Amy disse que falar sobre tendências de comportamento nesse cenário de pandemia global era como tentar calcular com precisão a trajetória de um carro que freia bruscamente na neve. Para ser bem-sucedida nessa previsão, seria necessário ter uma variedade imensa de informações que trouxessem a certeza de que pisar no freio te levaria para determinado caminho na estrada de gelo. Ao contrário disso, enquanto nosso sistema límbico recebe uma carga enorme de informações e tentamos tomar uma decisão do que fazer, a melhor resposta para essa derrapada na neve é aceitar o caminho por onde o carro está deslizando, e a falta de controle, observando com atenção para encontrar o momento certo de agir. Pode parecer errado e ruim, mas é essa ação que pode te tirar do deslize do descontrole.

O que fica claro na mensagem de Amy é que, apesar de nosso vício pela certeza, não é tempo de buscar “normais”, nem novos e nem velhos. O sistema límbico que a pesquisadora menciona é também conhecido como sistema emocional, onde formulamos nossas emoções, que não estão em um “lugar” desconhecido do subjetivo, mas se “encontram”, em forma de conexões neurais, bem no centro do nosso cérebro. 

Um pouco de ciência das emoções

A amígdala é responsável por processar nossas competências socioemocionais, tão necessárias, assim como processa nossas memórias emocionais, detecta ameaças e formula respostas. O hipotálamo é responsável por processar os estímulos sensoriais que recebemos, regula a produção hormonal e outros processos metabólicos, além de conectar o sistema nervoso ao sistema endócrino; o hipocampo formula nossas memórias de modo a criar coerência em nossas narrativas. Por último, é o tálamo que nos oferece controle emocional motores e sensitivos. Pode parecer simples, mas não é só isso, o sistema límbico possui outros corpos, conexões e elaborações bastante complexas que funcionando sistemicamente traduzem o que chamamos de emoções.

https://www.news-medical.net/health/Limbic-System-and-Motivation-(Portuguese).aspx

De volta às tendências

Uma série de macrotendências e drives de comportamento, anunciados por Amy ano passado e reforçados esse ano, estão conectados à biologia e isso não é à toa. Se o bem-estar, o autoconhecimento e as práticas restaurativas e contemplativas estiveram em alta por anos a fio, decodificando as tendências de 2008 do Wellness, a pandemia acelerou esse movimento a um ritmo exponencial. Um conhecimento muito mais profundo se fez presente e necessário. Faz muito sentido falar em neurociências e tendências de comportamento numa Era onde a Biologia se torna uma espécie de plataforma tecnológica que eleva à máxima potência a ligação do ser humano com as “máquinas”. 

O desk research, metodologia e organização de informações da pesquisa de tendências, propõe desenhos de cenários (de otimistas até catastróficos) como narrativas de futuros possíveis, com base nas hipóteses levantadas pelos dados da pesquisa. Isso só é possível porque nós somos capazes de imaginar e, muitas vezes, até sentir como seria nossa vida se…

Com essas histórias de futuros, modulamos nossos comportamentos para chegar em um desses cenários que criamos. E aqui está a mensagem principal desse texto e a maior conexão entre tendências de comportamento e neurociências: estudando nossos comportamentos e modos de vida, podemos identificar movimentos, esses que nos trazem pistas e sinais de futuros possíveis e que se tornam hipóteses e trilhas que vamos percorrendo ao longo do tempo. Mas, da mesma forma que nosso corpo tem uma complexa rede composta pelo sistema nervoso, órgãos sensoriais e que, misturados com os estímulos externos se tornam universos, nossos futuros também são altamente complexos e moldados pelo meio.

A Era sintética

Como definiu Amy e sua equipe.

Esse site de criação de pessoas sintéticas é um bom exemplo de como nossa realidade já está amplamente impactada pelo universo digital e virtual em níveis que, talvez, muitos de nós não estejam acompanhando, é muito mais do que um aplicativo ou um filtro do Instagram: Synthesia

O conceito de Realidade Diminuída imputa em dispositivos o comando para tirar ou diminuir elementos da realidade. Por exemplo, você coloca óculos e escolhe não ver o lixo que tem rua, os moradores de rua, uma pessoa que está caminhando ao seu lado, ou qualquer outra coisa esteja “atrapalhando” a sua realidade. 

A inteligência artificial já consegue captar e sintetizar emoções pela voz e/ou pelo movimento, e a biologia sintética tem uma variedade de utilizações como robôs orgânicos que literalmente estão vivos. 

É nossa realidade expandida para um universo virtual que nos oferece novos estímulos e consequentemente novas formulações e sensações preenchendo nosso sistema límbico.

Como será que vamos nos sentir?

Como você se sente agora?

O ano de 2021 pediu mergulhos mais profundos, em nós como espécie, na tecnologia, na sociedade, em nossos modos e em toda nossa existência. Amy finaliza sua palestra de 2021 dizendo que muito mais do que prever, é preciso preparar os futuros.

Sempre no plural! 

A pesquisa de tendências e as neurociências podem trazer grandes contribuições para nossa jornada que segue. 😉

Para conhecer todos os drives de comportamento, acesse o material:

Future Institute 2020 SXSW

Future institute 2021 SXSW

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